domingo, 16 de julho de 2017

Formando elementos por captura de nêutrons: o processo-s

Por Rafael Hideki Ishida, aluno do Prof. Dr. Jorge Meléndez


Como são formados os elementos mais pesados da tabela periódica


Quando analisamos a evolução das estrelas, observamos que o elemento mais pesado produzido por elas é o ferro. Isto porque as condições nos núcleos estelares não são suficientes para a fusão nuclear deste em elementos mais pesados. Contudo, o nosso cotidiano está repleto de materiais originados de elementos bem mais pesados do que o ferro. A resposta para esse problema se encontra nas estrelas que se encontram no ramo assimptótico das gigantes, o último estágio da evolução estelar antes da fase de anã branca. É nesta fase em que ocorre o primeiro passo para a formação dos elementos mais pesados: o processo de captura de nêutrons.

Este processo ocorre quando núcleos atômicos são bombardeados pelos nêutrons livres. Dessa forma, parte dos nêutrons são incorporados pelo núcleo, gerando isótopos daquele elemento. Essa adição de nêutrons torna o núcleo instável, forçando o processo de decaimento beta, em que um nêutron se transforma em um próton, emitindo um elétron e um antineutrino. Dessa forma, temos um aumento do número atômico, alterando o elemento. Por exemplo, núcleos de ferro, que possuem 26 prótons, ao capturarem um nêutron, se tornam em um núcleo de cobalto (27 prótons), após o decaimento beta. 

Processo de transformação de um núcleo de ferro em um núcleo de cobalto. Fonte: Adaptado - FREBEL, Anna; Searching for the Oldest Stars, 2015, p. 108.

Observações mostram que a captura neutrônica ocorre em diferentes escalas de tempo. Quando temos um alto fluxo de nêutrons (como em explosões de supernova), a captura de nêutrons se dá de forma muito rápida, de modo que sucessivas capturas são feitas antes que o decaimento possa ocorrer. Já quando o fluxo de nêutrons é baixo (como em estrelas AGB), a captura se dá de forma muito lenta, de forma que há tempo suficiente para o decaimento beta ocorrer antes de outro nêutron ser capturado. Para o primeiro caso, damos o nome de processo r (do inglês rapid process) e para o segundo, processo s (slow process), o qual analisaremos mais a fundo.

O processo s

À primeira vista, parece difícil achar uma relação entre as estrelas e os famosos letreiros de neon dos anos 80. Mas se lembrarmos do processo de evolução das estrelas e de como os elementos são formados, veremos que o neônio (além de outros gases nobres famosos por suas cores) são muito íntimos das estrelas gigantes. É quando a estrela se encontra no ramo assimptótico das gigantes que esses elementos são produzidos, através do processo s.

Esse processo ocorre principalmente em estrelas de 2 a 8 massas solares, na fase final do ramo assimptótico das gigantes. Nesta etapa, todo o envelope da estrela pulsa regularmente, de modo a trazer elementos produzidos pelo processo s para a superfície, alterando constantemente sua composição. O processo s ocorre em uma camada que se encontra entre a camada de queima de hélio e a camada de queima de hidrogênio. Ventos estelares podem levar embora boa parte da massa da estrela composta dos elementos recém sintetizados, enriquecendo o meio interestelar. É por esse motivo que as estrelas do ramo assimptótico das gigantes são importantes participantes na evolução química do Universo, formando muitos dos elementos pesados como o bário e estrôncio.

Localização da camada em que se dá o processo s. Fonte: Adaptado - FREBEL, Anna; Searching for the Oldest Stars, 2015, p. 110.

O processo s ocorre em uma camada na qual há a presença de hélio, devido à necessidade desse elemento para formar nêutrons. O núcleo de hélio, também chamado de partícula alfa, ao ser capturado por isótopos de carbono ou neônio, libera um nêutron. Após um tempo, há nêutrons suficientes para que os núcleos atômicos (principalmente de ferro) comecem a capturá-los. Antes que o núcleo possa capturar um segundo nêutron, ele decai liberando um elétron; com o decaimento do nêutron aumenta o número de prótons e portanto é produzido um elemento mais pesado. Cerca de metade dos elementos mais pesados que o ferro são produzidos dessa maneira. Elementos como estrôncio, molibdênio e paládio são exclusivamente formados pelo processo s. Mas muitos outros elementos são formados tanto pelo processo s quanto pelo processo r.

Exemplo da evolução de elementos ao longo de várias capturas neutrônicas via os processos s e r. Os quadrados mais escuros indicam núcleos estáveis e os mais escuros instáveis. As porcentagens indicam a fração de isótopos daquele elemento. Fonte: Adaptado - FREBEL, Anna; Searching for the Oldest Stars, 2015, p. 111.

Quando observamos estrelas como o Sol, não é de se estranhar a presença de elementos formados pelo processo s. Não podemos dizer o mesmo para estrelas de baixa metalicidade. Estas estrelas, nas quais o ferro e outros metais se apresenta em quantidades muito baixas, em tese, não deveriam apresentar elementos mais pesados. Contudo, observa-se a presença de elementos originados da captura de nêutrons nessas estrelas. Uma hipótese seria a presença destes elementos nas nuvens que originaram essas estrelas. Entretanto, as estrelas de baixa metalicidade são muito antigas, e, muito provavelmente, não existiam estrelas no ramo assimptótico suficientes para dispersar os elementos pesados no meio interestelar.

Uma solução para essa questão está nas estrelas binárias. Normalmente encontramos estrelas de baixa metalicidade junto de uma companheira. Esta normalmente evolui primeiro para o ramo assimptótico das gigantes, produzindo elementos mais pesados através do processo s. A estrela gigante, então, começa a transferir matéria para a estrela de baixa metalicidade, inclusive os elementos produzidos pela captura neutrônica, explicando assim a origem de estrelas pobres em metais com altos níveis de elementos do processo s

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