terça-feira, 13 de setembro de 2016

O que é Arqueologia Estelar?

Por Victoria Pardinho, Giovani Vicentin e Rafael Ishida, alunos do Prof. Dr. Jorge Meléndez


Afim de estudar o passado do nosso Universo, os astrônomos trocam as pás dos arqueólogos por telescópios (e muita paciência) para encontrar as relíquias do cosmos.


Se você quiser fazer uma torta de maçã do nada, primeiro tem que inventar o Universo”. Foi isso o que disse o astrônomo americano Carl Sagan, uma vez que os átomos de uma maçã foram inicialmente gerados, eras atrás, por processos de fusão nuclear no interior de estrelas. Outra frase do astrônomo muito cabível é Nós somos feitos de poeira de estrelas, e entendê-la será o nosso primeiro passo no estudo da Arqueologia Estelar
Para a formação de uma simples torta de maçã, muitos eventos complexos tiveram antes que ocorrer. Fonte: Adaptado - FREBEL, Anna; Searching for the Oldest Stars, 2015, p. 2.
Os elementos mais abundantes do Universo, o hidrogênio e o hélio, foram formados nas primeiras fases do Big Bang, mais especificamente, durante os primeiros minutos depois da grande explosão. Nosso conhecimento físico entende que o Universo começou numa fração de segundos após o Big Bang, considerado o início do espaço-tempo. Portanto, este representa o indescritível estado inicial de tudo. Durante os primeiros minutos que se seguiram, prótons, nêutrons e elétrons foram formados. O Universo então se expandiu rapidamente. Até este ponto, o único elemento químico que existia era o hidrogênio (H1), mais precisamente, apenas o núcleo do hidrogênio, um próton. Depois de dois ou três minutos a temperatura diminuiu para cerca de um bilhão de graus, onde os primeiros núcleos mais pesados que o hidrogênio, incluindo o deutério (também chamado de hidrogênio pesado, composto por um próton e um nêutron), foram gerados. O primeiro núcleo de hélio (He2) foi formado a partir do deutério, composto por dois prótons e dois nêutrons. O núcleo composto por quatro prótons chegou a ser formado na mesma época, mas foi imediatamente destruído, pois as condições do ambiente naquele momento não eram propícios para tal núcleo se manter estável. A colisão de vários núcleos de hélio causaram o terceiro elemento pesado, o lítio (Li3). Grosseiramente, 75% da massa total do Universo consiste em hidrogênio, 25% de hélio e apenas 0.000000002% lítio. Esta primeira fase da síntese dos elementos químicos foi completada após os três primeiros minutos, depois do Big Bang.
No entanto, para o surgimento da vida e dos seres humanos, estes três elementos químicos não eram suficientes. Acreditamos que para sustentar a vida, sejam necessários os elementos carbono, nitrogênio, oxigênio, ferro, e outros elementos da tabela periódica, e estes foram produzidos posteriormente, dentro de estrelas, durante bilhões de anos. Cerca de 380 mil anos depois do Big Bang, o Universo atingiu a temperatura de, aproximadamente, 3.000 K. Os núcleos e elétrons foram se movendo menos rapidamente, até que os núcleos, carregados positivamente, pudessem capturar os elétrons, com cargas negativas, de modo que estes orbitassem aqueles permanentemente. Matéria e radiação foram separadas, e o Universo opaco se tornou transparente pela primeira vez.
Desde que se tornou transparente, o Universo ficou 1.100 vezes maior. Por esta razão, a temperatura da radiação cósmica de fundo não é mais 3.000 K, mas apenas 2,7 K. E como ele continua a se expandir, futuramente esta radiação atingirá o zero absoluto, 0 K, ou -273,15°C. A radiação cósmica de fundo foi descoberta em 1964, pelos radio astrônomos americanos Arno Penzias e Robert Wilson, que receberam o Prêmio Nobel em 1978, embora outros já tenham previsto sua existência anteriormente. Com outro Prêmio Nobel foram premiados os astrofísicos americanos George Smoot e John Mather em 2006 que, juntamente com sua equipe, foram os primeiros a fazerem medidas precisas da radiação cósmica de fundo, usando o satélite COBE, e foram capazes de determinar a estrutura e extensão do Universo. Com estes dados, bem como com os obtidos pelo satélite WMAP, eles confirmaram que o Universo passou por uma fase muito quente, quando este ocupava um espaço imensamente pequeno, ou seja, o Big Bang. Também provaram a existência de uma ligeira aglomeração de matéria 380 mil anos após o Big Bang, isto é, quando a radiação cósmica de fundo foi originada. Estas estruturas foram se condensando e formaram estruturas cósmicas, em particular, galáxias.
As primeiras estrelas do Universo emergiram de gigantes aglomerados de nuvens de gás, compostas basicamente de hidrogênio, hélio e lítio da sopa primordial proveniente do Big Bang. A existência das primeiras estrelas alterou as condições para a formação das subsequentes estrelas, tornando-a cada vez mais eficiente. Mais e mais estrelas se formaram e, juntamente com o gás, se arranjaram em enormes nuvens de estrelas, que chamamos de galáxias.
Nos seus interiores quentes, as primeiras estrelas sintetizaram os elementos químicos mais pesados que o hidrogênio e o hélio e passaram a enriquecer quimicamente suas galáxias. Só depois de cerca de 9 bilhões de anos a nossa galáxia, Via Láctea, já estava rica em elementos capazes de formar o nosso Sol, juntamente com os planetas que o orbitam. A Terra, por exemplo, foi formada, dentre outros, a partir de elementos como o ferro, que foram primeiro sintetizados nas estrelas. A existência da vida humana na Terra só foi possível pela presença de água (H2O), a partir do oxigênio proveniente das estrelas e do hidrogênio gerado nos primeiros minutos do Universo; e é por isso que somos parte do Big Bang.

Mas... Como os astrônomos exploram o passado do cosmos?
Através da Arqueologia Estelar, que explora o Universo primitivo a partir de estrelas antigas, fazendo o levantamento de dados com um telescópio para este fim, sempre voltado para uma região particular do céu, obtendo posições, brilho, e outras características, como a cor das estrelas. Em algum momento o astrônomo detecta um objeto interessante, com substanciais informações, que será analisado posteriormente, com um telescópio pequeno ou médio (com espelho de 2 a 4 metros). Somente os melhores e mais promissores objetos serão observados com os maiores telescópios.
A procura por objetos interessantes não é um processo simples. Seja por observações em telescópios ou por pesquisas em longos catálogos, a busca por estrelas que possam trazer informações relevantes demanda tempo e paciência. Fonte: FREBEL, Anna; Searching for the Oldest Stars, 2015, p. 8.
Um arqueólogo estelar estuda, primeiramente, a composição das estrelas mais antigas da Via Láctea e, através destes dados, reconstrói as características das primeiras explosões das gigantes supernovas, que expeliram os recém sintetizados elementos ao entorno, e esse estudo irá nos ajudar a explorar como estes processos químicos e dinâmicos atuaram na formação de estrelas e galáxias.
Outra abordagem complementar estuda o Universo através das estrelas mais antigas e por meio de nuvens de gás e galáxias mais distantes, sendo necessários, aqui, potentes telescópios, como o Hubble, que tem fornecido imagens espetaculares desde 1990. Como a velocidade da luz é finita, a luz destes corpos gasosos extremamente longínquos levam bilhões de anos para chegar até nós, de forma que esta é uma maneira de analisarmos diretamente o passado do cosmos. Sabe-se, por exemplo, que cerca de 700 milhões de anos após o Big Bang, já existiam algumas estrelas.
Através da determinação da composição de estrelas antigas, os astrônomos podem entender a composição química do Universo nos seus primeiros milhões de anos de vida, assim como podem justificar os elementos que compõem as gerações seguintes de estrelas. Fonte: Adaptado - FREBEL, Anna; Searching for the Oldest Stars, 2015, p. 9. .